Atleta e vegetariano – uma combinação possível?

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Nos últimos anos acumulou-se evidência científica a favor do aumento do consumo de produtos de origem vegetal. Consequentemente, surgiram padrões alimentares mais restritivos, vulgarmente intitulados vegetarianos, cada vez mais frequentes na nossa sociedade. O interesse neste tipo de alimentação ganhou ainda mais adeptos com a descoberta de propriedades antioxidantes e antiinflamatórias, capazes de proteger as células, em produtos de origem vegetal.

“Dieta vegetariana” é um termo que define um padrão alimentar que utiliza sobretudo os produtos de origem vegetal. Assume-se que a carne e o peixe são excluídos, mas, na verdade, podem ser incluídos ovos e laticínios. Esta inclusão é um dos principais fatores de diferenciação dos diferentes tipos de dietas vegetarianas.

A alimentação vegetariana pode classificar-se como:

– Ovolactovegetariana – exclui carne e pescado, permite ovos e laticínios

– Lactovegetariana – exclui carne, pescado e ovos, permite laticínios

– Ovovegetariana – exclui carne, pescado e laticínios, permite ovos

– Vegetariana estrita e vegana – exclui todos os alimentos de origem animal

Existem ainda alguns indivíduos que se intitulam semivegetarianos (“flexitarians”). Embora este termo não esteja definido, é comummente aceite para se referir a um padrão alimentar que apenas exclui a carne ou o pescado, ou alguém que apenas reduziu a frequência com que os consome. Este tipo de alimentação não é, contudo, considerada vegetariana.

O padrão alimentar macrobiótico, não sendo considerado vegetariano, baseia-se predominantemente em produtos de origem vegetal. Os cereais integrais são a base da alimentação, complementada com hortícolas, leguminosas, algas e óleos vegetais. Ao contrário das dietas vegetarianas, o regime macrobiótico prevê o consumo de peixe. A carne, ovos e produtos lácteos ocupam o topo da pirâmide macrobiótica, pelo que o seu consumo deve ser reduzido e esporádico.

Tem sido muita a controvérsia sobre este tema, o que se agrava quando falamos em atletas. Se é verdade que todos os vegetarianos (aliás, todos os indivíduos) têm que ter cuidados com a alimentação, os atletas têm que ter cuidados redobrados, uma vez que têm necessidades nutricionais específicas. Uma aporte nutricional desequilibrado pode provocar quebras no desempenho desportivo, aumentar o risco de lesões e até diminuir a imunidade individual.

Apesar de existirem ainda muitos séticos em relação a este tipo de padrão alimentar em atletas, a American Dietetic Association reitera que as dietas vegetarianas, desde que devidamente planificadas, podem suprimir todas as necessidades nutricionais de um ser humano independentemente da fase do ciclo de vida em que se encontram (incluindo a gravidez, lactação, infância, adolescência e em idosos) ou do gasto energético adicional (atletas, por exemplo).

A literatura científica é cada vez mais frequente nesta área e parece existir evidência dos benefícios do consumo de produtos vegetais para o bem-estar geral, e que estes têm o seu papel na prevenção de doença, nomeadamente cardiovascular, oncológica, obesidade e diabetes.

O crescente interesse pelas dietas vegetarianas não se reduz apenas às questões da saúde.

Uma das principais razões apontadas para a opção por uma dieta vegetariana passa pela questão ambiental.

Com o aumento de interessados nestes padrões alimentares, a quantidade e a acessibilidade de informação disponível na internet e noutros meios de comunicação generalistas é cada vez maior. Se por um lado este crescimento poderia contribuir para uma maior literacia em saúde, por outro são veiculadas informações meramente comerciais, sem rigor científico, podendo colocar em risco a saúde de quem as segue. Assim, é importante que os potenciais vegetarianos procurem ajuda junto de profissionais habilitados.

Por norma, nas dietas vegetarianas tende a ser mais difícil atingir o aporte calórico diário recomendado para um atleta. No entanto, com a inclusão de alimentos de maior densidade calórica (frutos secos, sementes, entre outros) essa dificuldade pode ser colmatada. O consumo de proteína é um dos pontos fulcrais desta dieta vegetariana em atletas. Uma má ingestão proteica aliada a esforço físico exuberante culmina em catabolismo muscular (destruição de células musculares). As proteínas são constituídas por aminoácidos. Existem um total de 20 aminoácidos: onze desses, o organismo é capaz de produzir, apenas nove são exclusivamente assegurados pela dieta, os aminoácidos essenciais. As proteínas de origem vegetal são “mais pobres” visto que não possuem todos os aminoácidos essenciais. É possível garantir um aporte proteico adequado às necessidades, mas deve ser feita uma escolha criteriosa dos alimentos. A soja, a quinoa e o amaranto são três exemplos de fontes de proteína de elevado valor biológico, mas a alimentação vegetariana (à semelhança de qualquer outro padrão alimentar) deve apostar na diversificação.

Deve ser dada especial atenção à ingestão de alguns micronutrientes, nomeadamente vitamina B12, vitamina D, cálcio, zinco, ferro, iodo e ácidos gordos essenciais. O consumo de alimentos ricos nestes nutrientes deve ser encorajado e por vezes pode estar recomendada a suplementação, sobretudo em grupos vulneráveis. No caso dos atletas, a suplementação pode ser utilizada apenas em alturas concretas da preparação. O consumo destes suplementos deve ser sempre aconselhado e monitorizado por um profissional de saúde qualificado.

A principal fonte de ferro de uma dieta mediterrânea é a carne, pelo que a sua obtenção por outros alimentos é uma preocupação na orientação nutricional de um atleta. Contudo, existem várias fontes de ferro de origem vegetal que podem ajudar a suprir essas necessidades: os cereais integrais, os vegetais de folhas verdes, os figos, as lentilhas, os feijões e os frutos secos. Associar o consumo desses alimentos com fontes de vitamina C (por exemplo citrinos) é uma mais-valia, porque a vitamina C ajuda na absorção do ferro.

Em relação ao aporte de cálcio em atletas com alimentação vegetariana estrita /vegan pode estar severamente comprometido, uma vez que o cálcio se encontra essencialmente em produtos lácteos. Estas necessidades em cálcio parecem ser resolvidas se for reforçada a ingestão de legumes verdes e leguminosas.

A vitamina B12 está essencialmente presente em produtos de origem animal e por isso frequentemente em falta nos atletas com dietas vegetarianas. A suplementação e o uso de alimentos fortificados são recomendados.

Já no que toca ao consumo de alimentos ricos em OMEGA 3, habitualmente está abaixo do recomendado neste padrão alimentar, pelo que a suplementação é geralmente necessária.

Assim, em suma, atleta vegetariano é uma combinação possível? Sim!

Desde que devidamente acompanhados, os atletas podem adotar uma alimentação vegetariana sem comprometer a sua performance, saúde e rendimento. Para tal, é importante que atletas, treinadores, pais e outros envolvidos nas “carreiras desportivas” procurem informação e ajuda junto de profissionais habilitados, para que seja respeitada a escolha alimentar do atleta, sem comprometer a sua saúde e a performance desportiva.

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